O
filme A Batalha de Argel (La Battaglia di Algeri) do diretor italiano Gillo
Pontecorvo foi filmado na Argélia e lançado em 1965. O enredo do filme é
baseado no livro de memórias Souvenirs de la Bataille D’Alger escrito por um
dos líderes da luta pela independência no bairro árabe Casbah em Argel, Saadi Yacef. Não há um protagonista
no filme, pois ele tem como objetivo mostrar o coletivo como agente histórico
na luta pela independência argelina da colonização francesa.
Pontecorvo possuía influências
socialistas e do neo-realismo italiano¹ e esses elementos estão presentes no
seu filme, que apresenta o contexto pelo viés anticolonialista, contudo, sem
deixar de mostrar as contradições e posicionamentos dos dois lados que se enfrentaram
na Revolução argelina, como o próprio diretor comenta
Creio e, acima de tudo,
Franco Solinas² acreditava que é importante entrar na lógica de ambos os lados,
de antagonista e de protagonista. Então, se falamos dos pára-quedistas, por que
mostrá-los como monstros, ou como os SS? Para a condenação do colonialismo, que
era o nosso objetivo, é melhor identificar outros culpados: o erro e a
intransigência do colonialismo. (OLIVEIRA, p. 518).
Outra questão muito importante na
obra é apresentar os personagens com seus rostos humanos, ou seja, não
apresenta as pessoas de forma maniqueísta, pois ao mesmo tempo em que uma
personagem é capaz de matar dezenas de pessoas em prol de um objetivo maior
deixando uma bomba em certo local, ela é mostrada como uma pessoa comum, uma
mãe protetora e zelosa por seu filho. “A lógica dos dois lados nos é mostrada
sem estereótipos e sem maniqueísmos. Há uma ideia precisa nessas duas
sequências: levar a reflexão de quem assiste a pensar no jogo político no qual
aqueles sujeitos históricos estavam envolvidos, bem como o papel da violência
naquele contexto” (OLIVEIRA, p. 520).
O tom de documentário do filme, além
de outros símbolos e diálogos devem ser vistos no seu caráter crítico e
reflexivo. Exemplificando, há uma cena em que um prisioneiro antes de sua morte
pela guilhotina clama ‘Viva a Algéria!’ o que é contraditório pensando que a
guilhotina foi um dos símbolos da Revolução Francesa, essa que tinha como lema
Liberdade, Igualdade e Fraternidade, agora era usada para a repressão daqueles
que buscavam justamente a liberdade.
O filme aborda com sensibilidade e
criticidade o processo político que foi a revolução argelina, conduz o
espectador à reflexão das consequências da colonização, mas também do processo
de revolução já que há elementos no filme questionando se esse processo de
libertação de contradições não levaria ao estabelecimento de novas contradições
na sociedade, como o fato de que a FLN³ propunha a libertação daqueles que se
enquadravam nos seus preceitos morais, ou seja, não era para todos os
colonizados.
Dentro das possibilidades de um
filme ficcional e os objetivos do diretor ao produzi-lo, acreditamos que a
narrativa e os diversos aspectos do filme podem ser estudados e usados para
compreender o contexto da década de 50 na Argélia, bem como o contexto de
quando o filme foi idealizado e feito. Cabe ainda ressaltar o comentário do
historiador Marcos Napolitano sobre a obra que
mesmo
fazendo o elogio da revolução como processo histórico inevitável, utilizou-se
de uma interessante e peculiar estratégia narrativa – a relação dialética entre
repressor e reprimido, entre revolucionário e contra-revolucionário – para
refletir sobre a violência inerente às revoluções, evitando julgamentos morais
dos atores, mas explicitando o sistema de dominação – principalmente o sistema
colonial – responsável pela violência generalizada dos processos revolucionários
(NAPOLITANO, 2007: 82 apud OLIVEIRA, 2011).
¹ Movimento
cinematográfico que tinha como característica mostrar as pessoas comuns,
cenários reais, os problemas da sociedade. Tinha como pretensão atingir e
mostrar a realidade da época.
² Roteirista do filme que como o diretor partilhava
de ideias socialistas.
³ Frente de Libertação Nacional, grupo que lutou
para a independência da Argélia.
REFERÊNCIAS
BATALHA de Argel, A.
Direção: Gillo Pontecorvo. Produção: Saadi Yacef. Argel: Casbah Films;
VídeoFilmes, 1966. (121 min.) son. P&B. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=PB-xK_ViPck&index=2&list=WL>.
Acesso em: 31 maio 2015.
OLIVEIRA, Jefferson
Luis Ribas de. O cinema político de Gillo Pontecorvo: uma análise do filme A
batalha de Argel. Tempos Históricos,
v. 15, p. 505- 529, 2011. ISSN 1983-1463. (Versão eletrônica)
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