Panorama geral da política na Argélia no período entre as duas guerras mundiais.
Em 1919, após a 1ª Guerra Mundial, a chamada Lei Jonnart concedeu o direito de participação dos argelinos na eleição a alguns cargos municipais, inclusive o de prefeito, e na eleição para a assembleia do ‘douar-comuna’¹. Contudo, essa concessão limitava-se aqueles argelinos que tinham servido o exército, que eram proprietários de algum imóvel rural, e dentre outros requisitos, àqueles que sabiam ler e escrever em francês. Mesmo com essa ‘participação’ argelina - meio milhão no seu primeiro eleitorado - a desigualdade de representação política ainda era presente, já que esse grupo não conseguia decidir as votações a seu favor.
Essa melhoria política, limitada,
dos argelinos não significava que o ‘mal-estar’ entre a população deixava e
crescer. Este, provavelmente um sintoma das contradições e desigualdades dessa
colônia francesa, já que a França era um governo democrático para toda a
população, o que contrastava com a Argélia e sua democracia para poucos que
podiam decidir e possuir direitos. Além desse aspecto havia a situação da população
regida pelo estatuto dos argelinos, que não eram e nem foram considerados
cidadãos franceses o que era reivindicado por parte da sociedade da Argélia,
não apenas pelo aspecto de assimilação a França, mas por querer ter direitos e
garantias, ter sua emancipação. A colonização não interferia apenas econômica
ou politicamente, para os argelinos como escreve Ferhãt Abbãs, é
uma verdadeira revolução que veio
subverter todo um velho mundo de ideias e de crenças, um gênero de existência
secular. Ela coloca um povo diante de súbita mudança. E eis aí uma população,
sem o menor preparativo, obrigada a se adaptar ou perecer. Esta situação conduz
necessariamente a um desequilíbrio moral e material, cuja esterilidade não está
longe da desintegração total. (BERQUE, p.714).
Por outro lado, havia aqueles que se
recusavam a reivindicar a cidadania francesa. Começava a surgir alguns
movimentos ou aspirações nacionais nesse período, não tão definidas quanto as
que surgirão durante e pós Segunda Guerra, mas são o princípio de reivindicação
de direitos e autonomia argelina.
Desse período, vale ressaltar a
importância dos movimentos religiosos islâmicos que possuíam conotação política
e a afirmação da Argélia autônoma. Esses movimentos criaram escolas de ensino
árabe e lutaram para a libertação das instituições religiosas do Estado
francês, exigiam que os muçulmanos não deveriam abrir mão de suas leis e
moralidade vinculadas a sua religião para poder ter direitos iguais dentro do
sistema francês. Nesse contexto surge em 1931 a Associação de Ulemás²
Argelinos, fundada pelo xeque Mohammed Bem Badis, que adota o lema da Argélia a
sua pátria³, o islã sua religião e o árabe sua língua.
Em Paris, estudantes argelinos
estabelecidos na França fundaram a primeira organização política, a Estrela
Norte Africana (ENA), com o objetivo de independência da Argélia, que após a
sua direção ter sido assumida por Messali Hadj*, volta-se para a arregimentação
dos trabalhadores do Maghreb. A ENA foi dissolvida tempo depois pela repressão
francesa. Os franceses dissolveram várias outras organizações e partidos
políticos que surgiram nesse contexto, tornando-os ilegais já que havia um
embate de propósitos entre eles.
Um desses partidos criados, e
dissolvido em 1939, foi o PPA (Partido do Povo Argelino, que entre seus
fundadores estava Hadj) que cresceu e teve grande importância, principalmente
em Argel. Propunha “nem assimilação, nem separação, mas a emancipação” por vias
legais da Argélia.
Antes da Segunda Guerra Mundial, o
cenário que se delineava na Argélia era o de forte tendência anticolonial, com
o começo da movimentação política pela independência da França, reivindicada
por grupos dos mais diversos posicionamentos e idealizado por meios diferentes.
O ‘mal-estar’ começa a tomar conta e a ganhar corpo na Argélia.
¹células
territoriais com significado comunal.
²
Ulemás significa teólogos muçulmanos.
³
Pátria ou wata, não no sentido,
abertamente, de dawla – Estado.
*
Messali Hadj foi um importante líder político na luta de independência da
Argélia, sendo uma referência também do socialismo argelino. Atuou organizando
a luta de independência tanto na França quanto na Argélia.
REFERÊNCIAS
YASBEK,
Mustafa. A Revolução Argelina. São
Paulo: Unesp, 2010. (Coleção Revoluções no século XX).
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